sexta-feira, 12 de novembro de 2010

ACUPUNTURA: Considerações e reflexões sobre a Tradição e a Terapêutica. PARTE II

Continuando nosso artigo anterior, trazemos aqui algumas considerações a respeito do Yin e do Yang. Boa leitura!



O símbolo circular mostra duas marcas em forma de gotas, uma preta e outra branca, que se interpenetram, se complementam e se contemplam, uma invadindo a outra, inspirando movimento de expansão, quando girado no sentido horário e de contração quando girado no anti-horário. A imagem preta significa o Yin e a branca o Yang. Em cada uma delas há um ponto com a cor oposta significando que o Yin contém a semente do Yang e o Yang contem a semente do Yin. Um elemento não existe sem o outro e não existe nada, como fundamento da tradição, que possa ser exclusivamente Yin ou Yang.  Só esta figura, sem dúvida emblemática e repleta de significados, é um rico e extenso tema para a Semiologia e a Sinologia. De certo começaríamos afirmando que ela é um dos mais formidáveis e raros símbolos da engenhosidade humana, que expressa o todo e a parte vivendo em harmonia, em contraste e em constante mutação: contraria sunt complementae (os contrários se complementam). Este ícone deveria ser visto como uma bola tridimensional, mas bidimensionalmente ainda indica a concepção de sua criação, ou seja, a de uma constante integração entre uma força e sua contraparte, expandindo ou contraindo, cada qual levando em si a semente da outra.
É um símbolo que representa muito bem o conceito de integralidade e com isso dá pistas de como seus idealizadores percebiam o mundo em que viviam e a si próprios. Tudo está interconectado e é interdependente. Temos então uma primeira percepção do que é a Acupuntura apenas por entender um pouco suas origens e os significados de um código.

Nossa primeira dificuldade a expor, contudo, é que a tradição Chinesa não propõe verdadeiramente um saber, no sentido contemporâneo do termo. E é justamente aí que começam algumas dúvidas que parecem intransponíveis. Por isso a necessidade fundamental de debruçarmos um “olhar” diferenciado para “entender” as bases da Acupuntura. No vasto sistema que ela expõe, sobretudo no modo analógico de interpretação, os fundamentos não se baseiam em objetos ou quantidade em si, mas essencialmente em certas qualidades específicas da experiência humana que transcendem o saber e por este motivo provoca-nos uma discussão de como aprendemos a saber. Nisto reside boa parte da sabedoria. Assim, todo ser humano é um ente que une as essências do Céu e as da Terra e torna possível tudo o que daí brota e ao mesmo tempo constrói em seu centro (localizado no abdomem), chamado de “campo cultivável”, o essencial para ser um elo integrador, nutrido e nutridor, entre o que está acima e o que está embaixo de si.
Sem que haja, isoladamente, um “lá em cima” e outro “lá em baixo”, existe um “meio” onde as energias celestes e terrestres se encontram e formam uma grande família. Não é por coincidência que o país ou região de onde estas idéias floresceram não se chama exatamente China, mas País ou Povo do Meio. O Prof. Eyssalet em sua obra “Shen ou o instante criador” traduz uma passagem interessante: “...a unidade é a gênese da transformação das formas. O aspecto claro e leve em ascensão forma o Céu; o obscuro descendente forma a Terra; o sopro harmonizado do surgimento central constitui o ser humano...”.
Do encontro desses quantuns energéticos, do que está no alto (Céu), de magnitude Yang, com o que está embaixo (Terra), de magnitude Yin, junto com o nosso quantum {uma mistura da energia ancestral do pai(Yang) com a mãe(Yin)} surge uma das derivações mais importantes para a compreensão e uso da Acupuntura: a idéia da energia vital ou Chi (também conhecida como Qi ou Ki).

Uma vez formada pela união destas três fontes primordiais, Chi é distribuída para todo o organismo. Das três fontes, duas são renováveis: a do Céu, que traz a informação no ar que respiramos; a da Terra, que traz o alimento que ingerimos, e uma não renovável, que é a nossa energia ancestral, situada na região entre os Rins. A união das três energias, com-formam o Chi que vai carregar nutrientes e energia, ambos investidos de informação material e imaterial e nutrir tudo o que entendemos como corpo. Ela vai navegar, explorar, passear, surfar e distribuir-se assim como (aqui entra um sincretismo) o sistema arterial, venoso, linfático ou nervoso, por canais ou trajetos chamados de “meridianos”. Para ser mais exato ou didático, há uma divisão deste Chi em energias Yong e Sangue (nutridoras) e Wei (defensiva), que não exploraremos neste momento. O pensamento Chinês não separa mente de alma ou espírito. Existe uma manifestação das essências, como vimos, em constante fluxo e refluxo. A energia que circula pelos vasos, rios, mares, vales de nosso organismo sustentam, são sustentadas e se auto engendram reciprocamente e em retroalimentação, analogamente ao que conhecemos como autopoiese. Inauguram e mantém as entidades viscerais que “regem” cada segmento interdependente e são representadas no Shen do Coração, I do Baço e Pâncreas, Pro do Pulmão, Zhi do Rim e Roun do Fígado. A grande família se faz interconectando-se com uma rede mais superficial ou mais profunda, com ligações de passagem, colaterais entre outras, dentro de uma cadeia (teia) de meridianos, dos quais podemos citar 12 bilaterais e 2 únicos. Os 12 meridianos principais são apresentados a seguir, cada um (Yin) com aquele que atua de forma acoplada (Yang): Coração e Intestino Delgado; Baço-Pâncreas e Estômago; Pulmão e Intestino Grosso; Rim e Bexiga; Fígado e Vesícula Biliar; Circulação-Sexualidade e Triplo-Reaquecedor e finalmente um ventral e um dorsal: Vaso Concepção e Vaso Governador.      


Na próxima semana daremos continuidade nesta maravilhosa viagem pelos meridianos chineses.

Até lá então.


Maurici TF Santos 

Nenhum comentário:

Postar um comentário